Em entrevista ao jornal A Tribuna, Kazuo Nakano critica o padrão de verticalização em Santos

                                                          Foto: Vanessa Rodrigues.

Em entrevista concedida ao jornalista Vinícuis Holanda, publicada na página A7, da edição de ontem (15/4) do jornal A Tribuna, o arquiteto e urbanista Kazuo Nakano critica o processo de verticalização em curso na cidade de Santos. Kazuo aponta o aumento da segregação socioespacial, como decorrente desse processo, e defende a "regulamentação pública do mercado" como forma de combater a expulsão da população para a periferia regional. Leiam abaixo:

"Morar em áreas de risco é mais uma violência"
A TRIBUNA, Sexta-feira 15/4/2011, p. A-7
VINICIUS HOLANDA
DA REDAÇÃO
Entrevista
Kazuo Nakano
Urbanista e arquiteto do Instituto Pólis, entidade especializada em estudos de assessoria em políticas urbanas
O padrão de verticalização que o mercado imobiliário vem impondo às novas edificações de Santos não permite a otimização do aproveitamento do solo. A opinião é do arquiteto Kazuo Nakano, do Instituo Pólis, entidade especializada em estudos e assessoria em políticas urbanas. Segundo o urbanista, sem regulação pública quem perde são as classes menos favorecidas, empurradas para as áreas impróprias para habitação. Assim, acentua-se a desigualdade social. Para Kazuo, esse processo "gera violência atrás de violência, que, em algum momento, culmina em conflito de grupos sociais". Ele participou, na última terça-feira, da abertura da série de audiências públicas Santos e sua Cidade (ver quadro), realizada na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (Faus) da Universidade Católica de Santos (UniSantos), que discute a revisão do Plano Diretor do Município.
Hoje em Santos há um adensa- mento imobiliário, marcado pelos grandes empreendimentos. Em contrapartida, a população quase não cresce (conforme dados do Censo, entre 2000 e 2010, houve um aumento de menos de 2 mil moradores na Cidade). Quais os efeitos dessa equação?
É um processo de apropriação do solo urbano que ocorre em boa parte das grandes e médias cidades. Os investimentos público e privado estão aquecidos, o perfil de renda das pessoas melhorou, há maior oferta de crédito imobiliário. Tudo isso vai impactando. Nesse contexto, é fundamental um processo de regulação pública do mercado. Porque às vezes os investimentos no espaço urbano, sejam públicos ou privados, ao invés de trazer soluções, criam mais problemas.
Quais seriam?
Podem gerar tráfico em excesso, danos de infraestrutura, enchentes, o preço da terra aumentar...
E, por consequência, o risco de elitização do município?
Sim, os grupos mais pobres passam a não poder acessar terras e moradias. Há um processo de expulsão, principalmente para a periferia metropolitana. Aí ocorre a contradição citada por você: apesar de haver o aumento de metro quadrado de área construída, isso não repovoa. Porque segue-se não a lógica da apropriação da terra urbana pelo maior número de pessoas, mas a apropriação do solo para fazer negócio e vender. A especulação imobiliária. Aumentar o adensamento construtivo da cidade sem aumentar o populacional.
A regulação pública, por meio dos planos diretores e leis de ordenamento do solo, cria todos os mecanismos para que essas contradições possam ser evitadas?
É o único caminho. Mas é aí que estamos falhando, pois nunca conseguimos ter uma estrutura de regulação forte o suficiente para imprimir novos padrões de uso da terra, de verticalização.
O fato de a área urbaniza- da de Santos estar situada em uma ilha agrava essa situação?
Agrava, sim. Porque começa a acontecer uma escassez de terra, da qual decorre a valorização dos terrenos. A disputa pela terra fica muito mais forte. Quem perde, quando não há política pública, são os mais pobres. Quando você obriga os desfavorecidos a encontrar lugar na cidade, eles migram para as áreas de risco, várzeas, encostas de morro. Aí, como vemos todos os anos, os casos de tragédias se sucedem.
Ou seja, podemos enxergar relações entre a expansão imobiliária desmedida e a formação de bolsões de pobreza.
Esse processo todo vai gerando violência atrás de violência. Até explodir numa violência de homicídios. Interditar parte da população ao acesso real à cidade porque o preço é caro é um processo violento. Essa população terá de morar na periferia da cidade, de lá levará mais tempo para chegar ao trabalho, à escola. Morar em áreas de risco é mais uma violência. É um acúmulo de violências que, uma hora, explodem.
É fato que pessoas que hoje não conseguem se manter em Santos estão buscando alternativas em municípios vizinhos, como São Vicente e Praia Grande. Não existe a possibilidade do problema simplesmente se expandir?
Claro. Dificilmente essas cidades terão políticas habitacionais que possibilitem acolher esse pessoal que está chegando. Mesmo porque as principais oportunidades estão no polo regional, que é Santos. Então vão se aprofundando a desigualdade e a segregação social.

Comentários

  1. O assunto que mais deu pano pra manga no debate certamente é a "vertente" do tema da verticalização, a tal da Outorga Onerosa, esse instrumento que lembra mais nome de banda de garagem, e na qual vai ser muito difícil explicar sobre isso...

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  2. http://urbanidades.arq.br/2008/03/outorga-onerosa-do-direito-de-construir/

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  3. Região já recebe menos migrantes

    http://www.atribuna.com.br/noticias.asp?idnoticia=89593&idDepartamento=5&idCategoria=0

    Achei de um certo cinismo por parte da prefeitura em "comemorar" os números da diminuição da migração, segundo ele (o secretário) "é um resulta de um ótimo trabalho da prefeitura gerando empregos"...

    Guarujá contesta números. Santos comemora

    http://www.atribuna.com.br/noticias.asp?idnoticia=89594&idDepartamento=5&idCategoria=2

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