Os números da "favelização" em Santos

Acerca do último post, apresento abaixo uma tabela na qual compilei dados de várias fontes, para tentar estabelecer alguma comparação com os números divulgados pelo IBGE, referentes aos domicílios em assentamentos subnormais, na cidade de Santos, questão abordada na reportagem de A Tribuna comentada no referido post.
É importante destacar que, de acordo com o IBGE, aglomerados subnormais são "domicílios ocupados em favelas, invasões, grotas, baixadas, comunidades, vilas, ressacas, mocambos, palafitas, entre outros assentamentos irregulares existentes".
Ressalvo que os números apresentados na segunda coluna se referem às famílias residentes, respectivamente, em cada assentamento relacionado na primeira coluna, ao passo que na quarta coluna, os números se referem aos resultados do Censo Demográfico 2010, divulgados pela citada matéria, os quais se referem ao número de domicílios, situados nos assentamentos relacionados na terceira coluna e que em alguns casos não são exatamente os mesmos relacionados na primeira.
Portanto, existe uma diferença importante entre as duas colunas, pois nem sempre um domicílio corresponde a uma família, embora seja possível estabelecer uma equivalência nos levantamentos das diversas fontes utilizadas para obter os números apresentados na segunda coluna.
De qualquer forma, nos casos em que existia mais do que uma família no mesmo domicílio, a comparação favorece a política de controle da ocupação da Prefeitura. 
A comparação entre fontes distintas infelizmente é a única possível, pois é a primeira vez que o IBGE levanta o número de domicílios em assentamentos precários. Portanto, não se dispunha desta informação no Censo 2000.
Outro aspecto a considerar é que o recorte espacial de cada área variou na maior parte dos casos e em algumas situações foi necessário agrupar assentamentos para estabelecer uma comparação razoável, mas em outros não foi possível estabelecer esta comparação. Nestes casos a quinta coluna, que apresenta o percentual de crescimento ou de redução, não foi preenchida.
Existem, também, situações em que os assentamentos não existiam anteriormente, ou que não se dispunha informação acerca dos mesmos. Portanto, nestes casos, a comparação foi prejudicada.
Também alerto para o fato de que as fontes utilizadas na segunda coluna são de datas diversas. Assim, não faz muito sentido o total apresentado abaixo da mesma. Contudo, optei por totalizar o número de famílias mesmo assim, para que se tenha uma ideia aproximada da dimensão do desafio da nossa política habitacional.
No geral, observa-se que as áreas em que percentualmente o aumento foi mais significativo localizam-se nos morros. Nesta área existe um preocupante vetor de crescimento de assentamentos, desde o final da década de 1990, no eixo entre a Caneleira e a Vila Progresso, passando pelo Morro do Tetéo, Morro Boa Vista, Morro Santa Maria, Vila Cesar e áreas contíguas. Este vetor em grande medida foi resultante da falta de controle da ocupação, inclusive em áreas de risco de deslizamento e pela implantação de obras eleitoreiras que induziram o adensamento, como o asfaltamento do caminho do Morro do Tetéo.
O crescimento da Lomba da Penha também é impressionante e preocupante, pois ocorre em área muito complicada para a expansão da urbanização, do ponto de vista geológico. Também faço ressalva neste caso, pois não tenho o recorte espacial preciso referente ao número da segunda coluna. Assim, é possível que se esteja comparando uma área menor com outra maior.
Também merece menção o crescimento do complexo de favelas do Dique da Vila Gilda, que embora tenha sido percentualmente inferior aos casos mencionados acima, é nominalmente alto, dadas as dimensões do assentamento.
Além disso, é importante destacar que se trata de uma área que vem sendo objeto de urbanização desde meados da década de 1990 e se não fossem as contramarchas sofridas pelo projeto, a situação poderia estar muito melhor.
Quanto aos assentamentos que apresentaram redução do número de domicílios, nos casos de Vila Santa Casa, Vila Alemoa e Vila Pantanal, estas áreas foram objeto de intervenções urbanísticas, com a construção de unidades habitacionais, que permitiram atender parcialmente a demanda. No entanto, em todos estes casos as intervenções estão paralisadas ou muito lentas.
No caso da Rua Torquato Dias, no Morro da Nova Cintra, o mais provável é que a redução seja decorrente dos muitos despejos realizados na área, promovidos pelos seus proprietários, ao longo dos anos. Esta é uma área de aluguel de chão, onde não há segurança jurídica para os inquilinos que ficam inadimplentes, mesmo que estes tenham gastado todas as suas economias para construir suas moradias.
Por fim, mesmo considerando o crescimento vegetativo, que em áreas mais pobres costuma ser maior, deve-se considerar que a expectativa de vida também é menor nestes locais. Assim, a explicação mais plausível para o crescimento acentuado de alguns assentamentos é a migração, possibilitada pelas falhas no controle da ocupação destes núcleos.
Vale ressaltar, ainda, que a solução para estes assentamentos passam por distintas modalidades de intervenção, algumas das quais já estão equacionadas, porém são desenvolvidas com extrema lentidão. Além disso, a remoção de famílias para outras áreas ou a construção de unidades no mesmo local, deve ser a última das alternativas a serem adotadas, pois sempre é preferível consolidar as ocupações, por meio de projetos de regularização fundiária e urbanística.
Em outros posts pretendo comentar algumas situações específicas dos assentamentos relacionados abaixo.


Tabela. Santos: Evolução do número de famílias/domicílios residentes em assentamentos precários.
Assentamento
Famílias em Domicílios Subnormais
Assentamento
Moradias em Favelas (7)
Acréscimo (%)
Vila Santa Casa (²)
83
Vila Santa Casa
71
-14,4
Estuário (Rua Clóvis Galvão de Moura Lacerda) (3)
90
Estuário
ND
-
Complexo do Dique da Vila Gilda (¹)
3.241
Caminho São Sebastião (Dique da Vila Gilda)
1.264
42,4
Caminho São José (Dique da Vila Gilda)
1.082
Caminho da Capela (Dique da Vila Gilda)
589
Mangue Seco
165
Vila Telma II
251
Subtotal
4.615
Jardim Butantã (¹)
162
Butantã
167
3,0
Vila Alemoa (²)
1.039
Vila Alemoa
858
-17,4
Vila Pantanal (¹)
733
Pantanal
323
-55,9
Vila dos Criadores (¹)
199
Vila dos Criadores
281
41,2
Caminho da União (São Manoel) (¹)
411
Caminho da União (São Manoel)
479
16,5
São Manoel (Dique)
ND
São Manoel (Dique + ZEIS 1)
354
-
Caneleira III (¹)
469
Morro do Tetéo
319
14,0
Morro Caneleira
216
Subtotal
535
Morro Santa Maria (Dr. Chiquinho/Cuzcuz) (¹)
134
Morro Boa Vista
330
46,2
Morro Santa Maria (Pantanal II/Vila Nice) (5)
125
Morro Santa Maria (Pantanal II/Vila Nice + Vale Verde e altos do Morro do Tetéo)
475
280,0
Rua “1” (Nova Cintra) (4)
75
Rua “1” (Nova Cintra
ND
-
Núcleo não existente
ND
Menino Jesus
143
-
Vila César (4)
125
Vila César
170
36,0
Lomba da Penha (4)
95
Lomba da Penha
519
446,3
Campinho do Monte Serrat (4)
60
Monte Serrat
375
CI
Restante do Monte Serrat
ND
Morro do Marapé (¹)
20
Morro do Marapé
ND
-
Próprio Municipal do Saboó (Rua Ernesto Fulgoso) (4)
45
Próprio Municipal do Saboó
ND
-
Vila Progresso (8) (*)
478
Vila Progresso (**)
1.120
CI
Morro do Pacheco (8)
450
Morro do Pacheco (***)
726
CI
Morro do José Menino
ND
Morro do José Menino
418
-
Torquato Dias (6)
103
Torquato Dias
72
-30,0
Caminho Dona Adelaide (8)
51
Caminho Dona Adelaide
ND
-
Total
7.988
Total
10.767
CI
Fonte: (¹) COHAB Santista, cadastro realizado em 1999 e outras unidades da Prefeitura Municipal de Santos, (²) Cadastro realizado em 2000, (³) Cadastro realizado em 1996, (4) Levantamento realizado em 2000 pela Coordenadoria dos Morros, (5) Dados do autor (2000), (6) levantamento da Secretaria Municipal de Planejamento (2003), (7) Censo Demográfico 2010 (IBGE), (8) Levantamento realizado em 2004 pela Secretaria Municipal de Planejamento.
ND: Dados não disponíveis.
CI: Comparação inconsistente.
(*) Sem a Vila Vitória e com a Vila Telma de Cima e moradias da Rua 1 de cima.
(**) Com a Vila Vitória e sem a Vila Telma de Cima e moradias da Rua 1 de cima. 
(***) Inclui parte do Morro da Penha.
 

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