Prof. Pascoal Vaz: É preciso ter cautela ao utilizar o IDHM

Com referências elogiosas a este blogueiro (e que aumentam muito minha responsabilidade), o professor Pascoal Vaz produziu um artigo, publicado na edição de hoje de A Tribuna (veja abaixo), o qual é um texto referencial para se compreender a dicotomia entre aumento da riqueza e da desigualdade, em Santos.
O resultado do ranking municipal brasileiro do Índice de Desenvolvimento Urbano foi muito festejado em Santos, quando divulgado há duas semanas atrás, mas o professor recomenda que os dados sejam observados com cuidado, pois mascaram o persistente abismo entre pobres e ricos em nossa cidade.
Recomendo a leitura dos dados contidos no site do PNUD, que produz o IDHM, para quem quiser se aprofundar na questão. Este site traz o Atlas Brasil 2013, com os dados detalhados da pesquisa e uma análise bem reveladora da situação de Santos e dos demais municípios da nossa região.


IDHM: é preciso cautela ao utilizá-lo
JOSÉ PASCOAL VAZ. Economista, professor na UniSantos, pesquisador na Unisanta/Nese e membro do Movimento pró Memória José Bonifácio
Santos classificou-se em 6º lugar em IDHM-Índice de Desenvolvimento Humano Municipal, entre 5.565cidades, com 0,840, considerado pelas Nações Unidas como “de grau elevado”. Estes fatos podem estar induzindo a se pensar que em Santos a qualidade de vida já é muito boa, devendo a ênfase agora recair sobre o crescimento econômico. Esta concepção não pode impregnar os trabalhos do Plano Metropolitano de Desenvolvimento Estratégico da Baixada Santista e do colegiado para a revisão do PDS-Plano Diretor de Santos. O arquiteto José Carriço, que vai coordená-lo, além de competente, sabe que o PDS vai muito além da importante questão do uso e ocupação do solo. O PDS deve ser um Plano para o Desenvolvimento Social de Santos, forjado no confronto das forças sociais, com referenciais de longo prazo, que transcenda a vários governos. O crescimento econômico deve ser parte integrante do PDS de modo a ajudar a viabilizar a consecução do próprio PDS. Este deve balizar os Planos Plurianuais de Investimento, as Leis de Diretrizes Orçamentárias e as Leis Orçamentárias.
Sou entusiasta dos indicadores de DH, mas sua utilização precisa ser criteriosa, pois os IDHM ainda são calculados sem atentar para sua desigualdade em cada município e sem medir a eficácia de seus componentes, o que pode mascara a qualidade de vida para uma parte da população, parte significativa no caso de Santos, por pelo menos cinco motivos:
1º – a concentração da renda está aumentando aqui, com medida de Gini de 0,52 em 1991 e 0,55 em 2010, enquanto diminui no Brasil, com 0,63 e 0,60 (é natural o índice nacional ser pior que os municipais);
2º – em 1991, eram 2.486 as cidades com Gini melhor. Em 2010, passamos para 4.399, (79% das cidades eram menos desiguais que Santos);
3º – 71% dos santistas não atingem a média da Liberdade Substantiva (conceito de Amartya Sen, Nobel Economia/1998, sobre as condições reais necessárias para as pessoas desenvolverem seus projetos de vida feliz);
4º – o fato de estar havendo expulsão dos mais pobres devido ao elevado custo de viver em Santos, conforme livro organizado por Daniel Vazquez (A Questão Urbana na Baixada Santista- Ed. Leopoldianum, 2012) e;
5º - a desigualdade na oferta de qualidade nos serviços de saúde, educação etc é notoriamente contra os mais pobres, o que também não aparece no IDHM.

Espera-se que o compromisso do prefeito Paulo Alexandre de ter como principal objetivo o “combate ao abismo social” não seja abrandado pela divulgação do IDHM. O Diário Oficial de Santos de 31/7/13, no dia seguinte ao da divulgação do IDHM, publicou que “em ranking da ONU, Santos é a 6ª melhor em qualidade devida”, destacando que “os programas sociais da prefeitura ajudam a elevar o IDH da cidade”. Estes, quando bem feitos, são importantes. Mas é preciso ir muito além, com políticas públicas que induzam à criação de empresas que ofertem empregos com bons salários, via um fundo municipal de investimentos (parcela da população de Santos, devido à forte concentração da renda/riqueza, aplica expressivos recursos em outras praças), bem como via recapacitação de mão de obra; geração de renda, inclusive com forte apoio à economia solidária/cooperativas; complementação da renda per capita até que esta atinja a um quarto do salário mínimo; bons serviços de saúde, educação, transporte coletivo (porquê não com tarifa zero?); políticas contra a especulação imobiliária, com incentivo à habitação para os de baixa renda; introdução de IPTU progressivo com a renda e o patrimônio etc.
A Tribuna, 18 de agosto de 2013, p. A2.

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