Sem perspectivas (ou como a sociedade santista caiu no conto do combate à corrupção)



Por Marcos Pellegrini Bandini
Geólogo

Sede da Unidade de Operações de Exploração e Produção da Bacia de Santos, no Valongo, Santos.

É notório constatar a falta de perspectivas para o Brasil, sua classe trabalhadora e a população mais pobre, bem como para o Estado de São Paulo  e  particularmente para a Baixada Santista, principalmente quando nos deparamos com a escalada de notícias ultrajantes das últimas semanas, muitas delas vinculadas às  consequências da pandemia do novo coronavírus. Mas infelizmente não é só isso.
O desmonte da PETROBRAS e a entrega aos especuladores e ao capital estrangeiro da maior e mais importante empresa brasileira tem resultado em desemprego e perda de arrecadação na Baixada Santista, com o desligamento ou a transferência, em 2020, de centenas de trabalhadores de operação dos campos paulistas para o Rio de Janeiro. O cenário sombrio sinaliza inclusive com o fechamento da Unidade de Negócios da PETROBRAS inaugurada em Santos em 2006, no Governo Lula, do Partido dos Trabalhadores, e que atualmente passa por transferências ou demissões de técnicos e pesquisadores, antes responsáveis pela gestão do PRÉ-SAL, sendo este apenas um exemplo dessas consequências deletérias. Mas que exemplo!
Antes que retomemos a questão inicial, que é ausência de perspectivas, lembremos aos desatentos que a produção do PRÉ-SAL, descoberto em 2006, após a ampliação dos investimentos em mais de 100% entre 2003 e aquele ano, representa atualmente 70% da produção de petróleo brasileiro, que praticamente dobrou entre 2003 e 2019, passando de 565 milhões de barris de petróleo equivalente (b.p.e.) para mais de 1 bilhão e 53 milhões de barris (b.p.e.) no período, ou se preferirem, de uma média de 1,55 milhões de barris/dia para 2,92 milhões de barris/dia, consolidando a autossuficiência na produção, sendo 2 milhões de barris dia apenas do PRÉ-SAL.
Mais que isso, o PRÉ-SAL é a maior descoberta de petróleo do século XXI em todo o mundo e suas reservas são gigantescas, colocando o Brasil como um importante player internacional e representavam excepcionais perspectivas de arrecadação e de transferências para as áreas de ciências, educação e de saúde. Sem contar com a estratégia de nacionalização da importante cadeia industrial do petróleo, responsável na década passada por cerca de 14% do PIB brasileiro.
O PRÉ-SAL ampliou a produção paulista de petróleo em mais de 200 (duzentas) vezes entre 2003 e 2019 e transformou o Estado de São Paulo no segundo estado produtor brasileiro, alavancando a geração de royalties para o governo do estado e para os municípios paulistas e da Baixada Santista, onde foram arrecadados em 2018 mais de 220 milhões de reais, contra pouco mais de 15 milhões de reais em 2003. Ora, isso é muito bom e representa o esforço de parte considerável dos trabalhadores brasileiros em construir um futuro melhor para todos, e não para poucos.
Mas na contramão disso, as notícias são desanimadoras, como podemos depreender da diminuição da capacidade de refino e de produção de derivados e da tentativa de implantação no porto de Santos, pela COMGÁS, de um Terminal de Regaseificação. Trata-se de empreendimento inicialmente pensado na década de 1990, como porta de entrada do produto importado, antes da descoberta do PRÉ-SAL e das suas gigantescas reservas de petróleo e gás no próprio litoral paulista e fluminense, estados que também são nossos maiores consumidores desse insumo energético.
E quem ganha com um empreendimento tão perigoso, ambientalmente impactante, economicamente inviável por conta dos custos maiores do que o gás produzido no Brasil, além de atrasado tecnologicamente e que reforça nossa dependência energética?
O governo do Estado de São Paulo? Como, se isso significará menor geração de emprego e renda em seu território! O Brasil? Como, se passaremos a importar um insumo agora produzido em grandes volumes no PRÉ-SAL no litoral paulista e fluminense. A Baixada Santista e Santos? Como, se menos royalties, menos empregos e impostos e principalmente, se maiores e desnecessários riscos advirão com a implantação desse empreendimento importador de gás e do atraso em plena área central do estuário santista! Ou seriam porventura os Estados Unidos da América, que produzem grandes excedentes de gás por conta da sua insustentável e cara técnica de produção de petróleo através do fraturamento hidráulico e que atualmente buscam ampliar suas influências sobre o fraco governo brasileiro?
Apesar da conta não fechar, qual tem sido a resposta do governo paulista? Ou do Conselho de Desenvolvimento Regional da Baixada Santista – CONDESB que reúne os prefeitos da Baixada? O silêncio. Sempre o silêncio. Movimentam-se contra tal empreendimento, apenas os trabalhadores do setor de petróleo e gás e os ambientalistas. Particularmente, reputo tais iniciativas desastrosas aos desdobramentos sócio-econômicas do golpe de estado midiático-jurídico-parlamentar de 2016, que derrubou a ex-presidente Dilma Roussef, do Partido dos Trabalhadores, facilmente visíveis a qualquer cidadão intelectualmente honesto.
As perspectivas de melhora futura para a nossa região, para nosso estado de São Paulo e para o país exigem a superação da pandemia, maiores investimentos em saúde, educação, ciência e tecnologia e a recuperação de empregos e de direitos perdidos, cotidianamente ameaçados após o golpe de estado de 2016. E exigem nova postura de cada cidadão brasileiro sobre alterarmos nossas perspectivas para o futuro e desarmarmos as bombas e armadilhas que estão sendo colocadas em nosso caminho. Inclusive em reconquistarmos a democracia perdida em 2016. Quem se habilita?  



 

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