Câmara de Santos aprova mudanças em lei que regulamenta instrumentos do Estatuto da Cidade

Como parte do pacote de final de ano, na sessão de ontem, a Câmara de Santos aprovou o Projeto de Lei Complementar N° 1/2012, de autoria do Executivo, que altera dispositivos da Lei Complementar N° 551, de 27 de dezembro de 2005, que disciplina a utilização dos instrumentos de Política Urbana preconizados pela Lei Federal N° 10.257, de 10 de julho de 2011, Estatuto da Cidade, com parecer favorável e emenda da Comissão de Política Urbana.
A proposta visa principalmente atualizar a referida lei complementar, em face das modificações introduzidas pela nova Lei de Ordenamento do Uso e da Ocupação do Solo na Área Insular do Município, aprovada em 2011.
Dentre outras providências o projeto insere a área de abrangência do Programa Alegra Centro no conjunto de áreas onde imóveis são passíveis de parcelamento, edificação ou utilização compulsórios do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, de acordo com o artigo 182 da Constituição Federal e com o Estatuto da Cidade.
Defendo que toda a área urbana do Município esteja sujeita ao cumprimento da função social da propriedade, porém, como observa o parecer aprovado, “não deixa de ser um avanço a ampliação da área passível de aplicação destes dispositivos”. Melhor do que isto seria a Prefeitura notificar proprietários de imóveis que não cumprem a função social da propriedade urbana, como é o caso de algumas Zonas Especiais de Interesse Social na Zona Noroeste.
O projeto também modifica a forma de cobrança da Outorga Onerosa do Direito de Construir, importante instrumento de política urbana, que permite ao Poder Público recuperar e redistribuir a mais valia fundiária relativa à valorização imobiliária decorrente de investimentos públicos e privados realizados na área de um determinado empreendimento, desde que a ampliação do direito de construir não coloque em risco a capacidade de suporte da infraestrutura urbana nesta área.
No entanto, como já mencionamos neste blog (leia mais aqui), desde que este instrumento foi criado, foi pouco utilizado em virtude da grande permissividade da nossa Lei de Uso e Ocupação do Solo, em termos de potencial construtivo. E também, a recuperação e redistribuição da mais valia fundiária vem ocorrendo em níveis muito inferiores, com relação ao valor imobiliário das áreas acrescidas.
Além disso, metade do valor arrecadado com estas contrapartidas vem sendo destinado ao Fundo de Incentivo à Construção de Habitação Popular (FINCOHAP), enquanto a outra parte deveria ser destinada ao Fundo de Desenvolvimento Urbano. No entanto, este fundo não foi criado até o momento, embora seja objeto do Projeto de Lei Complementar N° 130/2012, de autoria do Executivo, cuja tramitação na Câmara se arrasta. Portanto, 50% do valor arrecadado com esta modalidade de contrapartida há anos vêm sendo destinados diretamente ao Tesouro Municipal, sem cumprir com sua finalidade. Porém, o projeto objetiva destinar integralmente os valores arrecadados para o FINCOHAP, o que sem dúvida é muito positivo, em termos de redistribuição da mais valia fundiária.
Em função da nova Lei de Ordenamento do Uso e da Ocupação do Solo, que reduziu o número de vias que compõem os Corredores de Desenvolvimento e Renovação Urbana (CDRU), onde é possível aplicar a Outorga Onerosa do Direito de Construir, a propositura também incorpora esta modificação, assim como a alteração da fórmula de cálculo da contrapartida.
A nova fórmula eleva de 0,7 para 2,0 o índice usado para o cálculo do valor mínimo exigido como contrapartida financeira. Assim, por um lado a propositura reduz a área potencial de aplicação do referido instrumento e por outro eleva os valores de contrapartida. Mas como a Lei de Ordenamento do Uso e da Ocupação do Solo não promoveu substancial redução do potencial construtivo nos locais onde incide a cobrança de contrapartida, esta mudança não deve resultar em significativo aumento da arrecadação de recursos para o fundo.
Outra alteração prevista pelo projeto refere-se à aplicação da Outorga Onerosa do Direito de Alteração de Uso do Solo, também criada pelo Estatuto da Cidade, e que institui percentuais de cobrança de contrapartida distintos, com relação aos usos pretendidos: 100% para o uso residencial, 80% para o uso de “flats” e 60% para o uso de hotéis.
Não tenho notícias da aplicação deste instrumento, até hoje, por isso não tenho como avaliar seus impactos. No entanto, espera-se que com as referidas mudanças haja algum estímulo para que isto ocorra. Porém, não consigo entender porque o projeto estabelece a destinação da contrapartida para o Fundo de Assistência e Desenvolvimento do Esporte.
Neste aspecto, a Comissão de Política Urbana apresentou emenda, aprovada junto com o parecer, destinando os valores de contrapartida ao Fundo de Desenvolvimento Urbano, que depende de aprovação do projeto que tramita lentamente na Casa.
Cabe salientar que a Câmara não realizou audiência pública para discussão deste projeto, apesar da existência de dispositivo no Plano Diretor de Desenvolvimento e Expansão Urbana do Município de Santos, que garante a realização de audiência, por se tratar de matéria regulamentadora do Plano. Porém, ainda há tempo para que isto ocorra, desde que marcada em horário compatível com a participação da maior parte da população e que se dê publicidade ampla do teor da proposta. Mas o projeto está pautado em segunda discussão, na sessão da próxima segunda-feira. Portanto, o mais provável é que a participação da sociedade seja mais uma vez atropelada pelo Legislativo santista.

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