O novo Centro de Atividades Turísticas é nocivo à pesca em Santos

 

O Centro de Atividade Turística (CAT), em construção na Ponta da Praia, já está afetando negativamente a cadeia produtiva do pescado, em Santos. Para que o CAT fosse construído, a Prefeitura obteve da União a cessão de uma parte da área do Terminal Pesqueiro Público de Santos (TPPS), com 9.994,02 m², para ampliar a praça Gago Coutinho e o sistema viário em seu entorno (ver foto abaixo).


Esquema da ampliação da Praça Gago Coutinho com redução da área do TPPS

Essa mudança no geométrico da praça reduziu a possibilidade de expansão de nosso Terminal, cujo edifício principal havia sido demolido ilegalmente em junho de 2001, pela empresa americana Wal-Mart, condenada posteriormente pela Justiça Federal. A recomposição da infraestrutura original do Terminal sempre foi um desejo do setor pesqueiro de Santos, o que agora se tornou mais difícil em face da perda substancial de área. Esta redução também impede que durante safras com grande movimentação, como a da sardinha, haja espaço extra para estacionamento dentro do TPPS. Observe na foto abaixo, o estacionamento de caminhões na área subtraída do TPPS.

Caminhões estacionados na área subtraída do TPPS (em amarelo)

Igualmente grave foi o fato de que o CAT foi construído em cima do reservatório de água e da subestação de energia elétrica que abasteciam a fábrica de gelo do Terminal, desativada desde 2016 (ver figura abaixo). O reservatório tinha capacidade de 400 m³ e a subestação rebaixava a tensão de 13.800 V para 2.400 V. Sem ambas, a fábrica está impedida de fornecer um dos insumos mais importantes para a pesca, que é o gelo. Quando funcionava, a fábrica comercializava gelo a R$ 2,00 a caixa e permitia a comercialização do peixe mais barata. Além disso, desde sua inauguração, a fábrica de gelo sempre foi superavitária, contribuindo para a sustentabilidade econômica do TPPS.


Construção do CAT em cima de onde estavam o reservatório de água (2) e a subestação de energia (3) da fábrica de gelo (1) do Terminal Pesqueiro.

Para completar os danos à atividade pesqueira, o vídeo abaixo,  disponível no site da Associação de Apoio ao Terminal Público de Pesca de Santos (ATPS), mostra as consequências da obra do CAT para o comércio atacadista que ocorria em torno do antigo Mercado de Peixes, demolido parcialmente. Agora, este comércio que ocorre todas as terças, quintas e sábados, entre 4 e 6 horas da madrugada, fica espremido no lado sul da praça Gago Coutinho, devido à mudança do geométrico da praça, resultante do projeto do CAT. Além de provocar transtorno ao trânsito, o comércio é realizado no meio do leito carroçável, inclusive levando riscos aos milhares de ciclistas que por ali transitam.


Em vídeo, a ATPS mostra o caos viário do comércio atacadista de pescado, na Praça Gago Coutinho.

A obra do CAT exigiu a prévia aprovação de um Estudo de Impacto de Vizinhança (EIV), nos termos da Lei Federal nº 10.257/2010, Estatuto da Cidade, e da Lei Municipal que disciplina a matéria, Lei Complementar nº793/2013. O EIV do CAT, que pode ser acessado aqui, não previu as consequências da redução do terreno do TPPS, nem a demolição da infraestrutura da fábrica de gelo, nem tampouco os impactos viários denunciados pela ATPS. 

A obra do CAT só foi possível graças a uma mudança pontual na Lei de Ordenamento do Uso e da Ocupação do Solo da Área Insular de Santos, Lei Complementar nº 1.006/2018, que permitiu a celebração de um termo de compromisso entre uma empresa do Grupo Mendes e a Prefeitura, mediante o qual, o grupo empresarial poderia obter a liberação para outros usos, do terreno onde antes funcionava o Mendes Convention Center. Este termo, celebrado em 15/10/2018, previu uma série de contrapartidas a serem prestadas pela empresa, dentre elas a construção do CAT. Conforme a negociação, o CAT será repassado para o município que está tentando passar sua administração para a iniciativa privada. Para isso, já realizou uma licitação, que deu deserta. Ou seja, até o momento, não apareceu empresa interessada em explorar o CAT e Santos corre o risco de ficar com um abacaxi nas mãos. Alíás, uma transferência de abacaxi privado para a esfera pública, pois o Grupo Mendes só teve interesse na negociação, porque a alteração da Lei de Uso do Solo garantiu a mudança de uso do imóvel onde antes funcionava o Mendes Convention Center, que agora poderá ser locado para outras atividades. Caso a Prefeitura não encontre um interessado pelo CAT, todos os danos à cadeia produtiva do pescado terão sido em vão e o município ainda arcará com o prejuízo de manter a enorme estrutura que está sendo construída na Ponta da Praia.






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